Com dúvidas sobre carta precatórias (C.P)? Vamos neste artigo responder aos principais questionamentos.
Cada Juiz possui um poder conferido pelo Estado para aplicação do Direito nos casos concretos, a este poder é dado o nome de “jurisdição”, e esta autoridade irá exercer a sua jurisdição dentro de certos limites administrativos/geograficamente estabelecidos;
Ou seja, um Juiz do Estado de São Paulo, por exemplo, possui jurisdição tão somente no que diz respeito àquele Estado da federação, não podendo cumprir atos em outros locais, uma vez que não possui poderes para isso.
Mas agora imagine que um determinado Juiz precise cumprir um ato, mas está fora da sua jurisdição, como ele fará então para dar andamento ao processo se não possui poderes para tanto?
Ele deverá expedir uma carta precatória para autoridade que possui poderes no local em que ele deseja cumprir o ato; a autoridade que faz o pedido é chamado de Deprecante ao passo que a autoridade que irá receber o pedido é denominada Deprecada.
Vale salientar, no entanto, que não é somente o Juiz que poderá fazer uso deste instrumento, mas também outras autoridades, à exemplo de um Delegado de Polícia, que necessite executar ordens fora do seu âmbito legal de competência (carta precatória criminal).
A carta precatória e seus institutos no âmbito cível será o principal objeto de análise do artigo em questão, abordando não só o seu conceito, mas também prazos, funcionalidades, procedimentos e outras nuances desse instrumento tão importante para o Direitos.
O que é carta precatória?
A carta precatória é uma ferramenta jurídica que existe para que ordens emitidas por determinadas autoridades possam ser cumpridas em locais em que elas não possuem competência para atuar.
Logo, o que se percebe é que a carta precatória é uma forma de comunicação entre juízos diversos e que tem por propósito cumprir determinado ato processual, uma citação, apreensão, penhoras, dentre tantos outros que não podem ser cumpridos pela autoridade deprecante.
Cumpre destacar que se trata de um instrumento em que algumas formalidades deverão ser observadas, sendo assim, para que tenha validade deverá cumprir alguns requisitos, quais sejam:
- A indicação do Juiz deprecante (ou seja, aquele que irá realizar o pedido de cumprimento do ato; juiz de origem)
- A indicação do Juiz deprecado (o juiz que irá cumprir o ato)
- Realizar a menção do ato processual que constitui o objeto (a diligência a ser cumprida)
- Encerramento com a devida assinatura do Juiz
O que se percebe, portanto, é que a carta precatória é um instrumento que visa, sobretudo, dar celeridade ao processo judicial, tendo em vista que se ela não existisse seria muito mais burocrático e custoso para o Judiciário brasileiro a realização de determinados atos;
Em um cenário sem a existência da carta precatória, por exemplo, um Juiz que quisesse ouvir uma testemunha em um Estado da Federação diverso daquele que possui competência teria que se deslocar até a testemunha para ouvi-la, o que seria extremamente contraproducente e inviável.
Da leitura do artigo 237 do Código de Processo Civil é possível visualizar esse caráter colaborativo da precatória ao dispor que a carta será expedida para que órgão jurisdicional brasileiro pratique ou determine o cumprimento, na área de sua competência territorial, de ato relativo a pedido de cooperação judiciária formulado por órgão jurisdicional de competência territorial diversa.
Qual o prazo de cumprimento da carta precatória?
A Constituição Federal estabelece que em se tratando do fator tempo, seja no âmbito judicial ou administrativo, será assegurado a razoável duração do processo, bem como os meios que garantam celeridade de sua tramitação.
Desse modo, não poderia ser diferente em relação a carta precatória, tendo em vista que o Código de Processo Civil deve observar as disposições constantes da Carta Magna;
O legislador, portanto, conferiu ao próprio juiz que expede a carta precatória estabelecer o prazo para o cumprimento da ordem, desde que seja razoável e que não deixe de observar a celeridade da tramitação processual.
À título de exemplo o artigo 222 do CPC dispõe que a testemunha que morar fora da jurisdição do juiz será inquirida pelo juiz do lugar de sua residência, expedindo-se para esse fim, carta precatória, com prazo razoável, intimada as partes.
O mesmo podes ser observado da redação do artigo 261 também do Código de Processo Civil ao dispor que em todas as cartas (e aqui está inclusa a precatória) o juiz é quem irá fixar um prazo razoável para o cumprimento, desde que atendida as facilidades das comunicações e a natureza da diligência.
Em síntese, o que se observa é que “prazo razoável” é um conceito jurídico indeterminado e que exige uma observância individual por parte do juiz de acordo com a natureza do caso concreto para estabelecer se o ato a ser cumprido exige maior ou menor tempo.
Qual o procedimento de emissão da carta precatória?
A carta precatória foi criada com um propósito de estabelecer comunicação entre juízos e assim conferir maior celeridade ao tramite processual, sendo assim, visando contribuir com esse cenário o novo código de processo civil estabeleceu a emissão dessas cartas por meio eletrônico;
É o que se observa da redação do artigo 263 ao dispor que as cartas deverão ser expedidas preferencialmente por meio eletrônico, hipótese em que a assinatura do juiz também deverá ser eletrônica, na forma da a lei.
Esse procedimento deve observar alguns requisitos, especialmente no que diz respeito àqueles que irão auferir autenticidade para a carta precatória enviada por meio eletrônico, ou seja, os códigos alfanuméricos que constam dos documentos digitais.
Atente-se que antes do Novo Código de Processo Civil havia disposição por parte do código de 1973 referente à expedição de carta eletrônica por meio digital, portanto, não se trata de novidade, mas de regulamentações mais específicas por parte da legislação mais recente.
Assim, a substituição do reconhecimento de firma por parte do juiz e a utilização de inovações tecnológicas para envio da referida ferramenta jurídica surge como uma proposta de desburocratização do judiciário e agilidade no cumprimento de suas funções.
Da distribuição da C.P em meio eletrônico
O tópico acima demonstrou a inclinação por parte do novo código de processo civil no sentido de que as cartas precatórias sejam expedidas por meio eletrônico a fim de que o processo se torne mais célere e eficiente.
Dessa forma, à título de exemplo usaremos o Estado de São Paulo para visualizarmos como funciona a distribuição de uma Carta Precatória. Em um primeiro momento é importante destacar que essa distribuição será realizada pelo advogado;
O patrono deverá indicar o juízo deprecado, a competência (cível ou criminal), bem como a classe processual (no caso, Carta Precatória), além de demonstrar o assunto principal.
Vale destacar que a carta não necessita estar acompanhada de petição, ela própria é suficiente para a distribuição, desde que instruída com os documentos corretos para que seja cumprida e com as taxas devidas na hipótese de não concessão da justiça gratuita.
Em relação a essas taxas de recolhimento, são elas: taxa judiciária, bem como a taxa de impressão que são necessárias para que a diligência possa ser cumprida no juízo requerido, além da diligência a ser realizada pelo oficial de justiça.
Qual a diferença entre carta precatória e carta rogatória? NÃO CONFUNDA – (Carta Precatória x Carta Rotatória)
Ponto importante e que merece destaque é o instituto da carta rogatória; trata-se de ferramenta jurídica bastante similar à carta precatória, mas que com esta não deve ser confundida visto que possui finalidade diversa.
A carta rogatória também será uma forma de comunicação judicial e que visa conferir celeridade aos procedimentos, no entanto, trata-se de comunicação entre países diferentes;
Nesse caso, o processo judicial estará tramitando em determinado país, no entanto, algum ato tem de ser cumprido em outro, logo, expede-se carta rogatória a fim de que ele seja cumprido.
O que se percebe, portanto, é que, assim como a carta precatória, trata-se de uma forma de colaboração entre juízos para que atos e diligências sejam praticados, mas em âmbito internacional e observada as regras de Convenções Internacionais.
Citação por mandado x citação por carta precatória
A citação por precatória, conforme já foi amplamente discorrido nos outros tópicos, se dá nas hipóteses em que esse ato tiver de ser cumprido em juízo diverso em que a autoridade não possui poderes para tanto.
A citação por mandado, por sua vez, estará configurada quando o citado se encontra na mesma localidade em que o juiz possui competência para realização do ato, não necessitando assim da expedição de carta precatória.
Desse modo fica claro que a diferença entre os dois institutos está alicerçada na razão de existência da carta precatória, ou seja, a jurisdição e a relação da haver ou não competência para realização do ato.
Sendo assim, um juiz que possua jurisdição na cidade de São Paulo e necessita citar um indivíduo na mesma cidade fará por meio de mandado, ao passo que se a mesma citação tivesse de ser cumprida no Estado de Santa Catarina, necessitaria de carta precatória para que a medida fosse realizada.
O juízo deprecado pode recusar a cp enviada?
Em determinadas situações pode vir a ocorrer do juízo que recebe a carta precatória recusar o seu cumprimento, no entanto, vale salientar que o juiz que assim fizer deverá fundamentar os motivos pelos quais rejeitou a medida;
Nesse sentido, poderá o juiz não realizar o disposto na carta precatória quando verificar que os requisitos legais não estão presentes, bem como na hipótese do juiz tiver dúvidas quanto a autenticidade da carta em questão.
Outro cenário em que seria permitido o não cumprimento da precatória pelo juízo deprecado é quando faltar ao juiz competência em razão da matéria ou hierarquia, nesses casos poderá o juiz incompetente remeter a carta ao juiz ao tribunal correto.
Da demora no cumprimento da carta precatória (qual a solução?)
Não rara às vezes em que o cumprimento do ato ou diligência a ser cumprido pelo juiz deprecado se estende por mais tempo do que o normal, violando a expressa disposição acerca da razoável duração do processo.
Sendo o Brasil um dos países que mais litigam no mundo a consequência é um inchaço do Judiciário de tal forma que não consiga atender todas as demandas em tempo hábil.
Nesse sentido, a jurisprudência se manifesta por responsabilizar o juiz ou o tribunal que demore mais do que o razoável para atender o cumprimento da carta precatória, evitando lesão à parte interessada;
Dentre algumas medidas destaque-se a notificação do juiz/tribunal para a efetiva resolução de forma célere, não dando margem para extinção do processo ou para algum tipo de prejuízo aos envolvidos na demanda.
Quanto ao interessado, este poderá se utilizar de recursos a fim de que a diligência requerida seja cumprida o quanto antes, inclusive apelar quando da hipótese em que o processo é extinto em virtude do não cumprimento daquilo que foi requerido na carta precatória.
SÍNTESE
A fim da fixação dos conceitos analisados sobre carta precatória, alguns conceitos merecem destaque, quais sejam:
- Carta Precatória é um instrumento jurídico para que autoridades possam cumprir diligências em locais que não possuem competência
- O prazo de cumprimento de uma carta precatória será definido pela autoridade que a emitir, desde que seja razoável
- Carta Precatória é diferente de Carta Rogatória, esta última também é um instrumento de comunicação entre juízos, mas em âmbito internacional
- O novo CPC destaca a utilização de meio eletrônico para emissão de Carta Precatória
- A não observâncias dos requisitos legais, bem como a ausência de competência do juiz para realização da diligência requerida são hipóteses em que o juízo deprecado poderá recursar cumprimento da precatória
- A jurisprudência é no sentido de responsabilização dos juízes e tribunais que não derem cumprimento à carta precatória em tempo hábil
REFERÊNCIAS:
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