As ações reivindicatórias são instrumentos jurídicos utilizados nas hipóteses em que determinado indivíduo deseja proteger a sua posse em virtude da prática do esbulho, turbação ou ameaça;
Para tanto, poderá fazer uso dos seguintes interditos possessórios, quais sejam: a ação de reintegração de posse, ação de manutenção de posse ou interdito proibitório;
Ocorre que, existem situações que este indivíduo não detém a posse direta, sendo assim não é cabível as ações citadas acima, dando margem para o uso da ações petitórias, também chamadas de ações possessórias indiretas.
Dentre essas ações temos a ação reivindicatória de posse, a qual será abordada no artigo em questão no tocante não só ao seu conceito, mas também seus requisitos de aplicação e diferença com outros tipos de ação.
Ações Petitórias (Ações possessórias indiretas)
Antes de abordarmos a reivindicatória vale destacar a ação de imissão na posse, esta também possui uma classificação, segundo a doutrina, como ação possessória indireta e é aplicada nas hipóteses em que o autor deseja ter a posse pela primeira vez; nesse tipo de ação ele consegue a autorização para entrar na posse.
Um exemplo de imissão na posse é a pessoa que realiza a compra de um imóvel em um leilão, mas existem terceiros no imóvel que se recusam a sair; neste caso poderá o adquirente do imóvel em questão propor a ação de imissão na posse a fim de conseguir a posse para si.
Seguindo essa linha de raciocínio, reivindicar significa recuperar, reaver, requerer algo que se tem direito, nesse sentido, a ação reivindicatória é um instrumento jurídico que tem por propósito reaver para o proprietário a posse de um bem que está injustamente com outra pessoa, ou seja, este último a detém de forma injusta.
Nesse sentido, diferentemente do que ocorre com as ações possessórias em que o autor da ação tem por fundamento a posse que detém ou que já teve, aqui o fundamento é o documento do imóvel (o domínio/registro);
Ou seja, só poderá usufruir desse tipo de ação aquele que tiver o seu nome no registro do imóvel, do contrário não será a ação reivindicatória o instrumento apropriado para reaver a posse.
Da leitura do artigo 1.228 do Código Civil de 2002 é possível visualizar o instituto da ação reivindicatória:
Artigo 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
Assim, ao dispor em sua parte final acerca do direito de reaver a coisa em poder de que injustamente a possua ou detenha, o legislador atribuiu ao proprietário que possui o registro em seu nome a possibilidade de intentar ação e recuperar a coisa que está com terceiros.
Sendo assim, imagine que uma pessoa tem uma casa na praia, possui documentação regulamentada em seu nome, mas não frequenta essa casa de praia há algum tempo;
O dono em questão resolve vender o imóvel, no entanto, ao se deslocar até ela para colocar a placa de “vende-se” depara-se com um casal morando na residência, nesse caso a ação adequada será uma reivindicatória, tendo em vista que o fundamento que será apontado não será a posse (até por que ele não ia na casa há algum tempo), mas o registro que está no nome do proprietário.
Ação Reivindicatória x Usucapião
Ponto importante a ser destacado aqui é que um dos requisitos do usucapião é a posse mansa e pacífica, juntamente com “animus domini” – a intenção de ter a coisa para si – e o lapso temporal expresso em lei, além de outros a depender da espécie de usucapião;
Ocorre que a propositura de uma ação reivindicatória tem o condão de “estragar” o requisito da posse mansa e pacífica do usucapião, tendo em vista que ao ingressar com esse tipo de ação haverá litígio entre as partes afastando a mansidão e pacificidade.
Sendo assim, o autor de uma ação de usucapião deverá juntar certidões de distribuição cível, tanto em nome do autor quanto dos réus, devendo estas certidões possuírem um caráter negativo, mas ao ser proposta a ação reivindicatória a certidão será positiva estragando assim o perfil manso e pacífico daquela posse.
No entanto, atente-se que esta característica não é exclusiva de uma ação reivindicatória (ação possessória indireta), mas também das ações possessórias diretas (interdito proibitório; manutenção de posse e reintegração de posse), devendo ser observado o caso concreto.
Requisitos da Ação Reivindicatória
Dentre os requisitos para a propositura de uma ação reivindicatória podemos destacar os seguintes: a existência de domínio sobre a coisa que está sendo reivindicada (o registro em nome do autor da ação, lembre-se que o fundamento não é a posse, mas o registro da propriedade);
Ainda, a individualização da coisa reivindicada; nesta hipótese o autor irá demonstrar de maneira minuciosa as limitações, confrontações, bem como a localização do imóvel.
E, também, será requisito a demonstração de que há o exercício da posse injusta por parte do réu, ou seja, não existe uma causa jurídica que viabiliza a manutenção da posse com ele.
Ações Petitórias x Ações Possessórias (Reivindicatória x Reintegração de posse)
No tocante a diferença existente entre ação reivindicatória e ações possessórias vimos que enquanto a primeira tem como base para sua propositura o domínio do bem, a segunda tem a posse como seu fundamento legal;
No entanto, a fim de uma maior elucidação e compreensão sobre o tema traçaremos um comparativo acerca da ação reivindicatória e a ação de reintegração de posse; vejamos.
A ação de reintegração de posse está expressa no artigo 1.210 do Código Civil de 2002 com os seguintes dizeres:
“Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.”
Para o entendimento da ação de reintegração de posse é importante destacar primeiramente a definição de esbulho; trata-se da hipótese de privação total da posse de um bem em virtude de clandestinidade, precariedade ou violência.
Assim, aquele que antes detinha a posse não mais a terá por que alguém a privou de forma sorrateira, abusando da confiança ou usando de força física ou moral para usurpar a posse do bem.
Nada impede, no entanto, que o proprietário do bem venha a realizar a prática do esbulho; é possível visualizar essa situação naquelas hipóteses em que o locatário retira à força o locador antes do término de contrato de locação.
Nesse sentido, como o próprio nome sugere, a ação de reintegração de posse está diretamente vinculada à posse do bem, não sendo discutida aqui a questão referente ao domínio, mas tão somente à posse;
À título de exemplo imagine que uma determinada pessoa mora em uma fazenda e um movimento social invade aquele local, expulsa as pessoas que lá moravam e passam a viver ali;
Observe que antes da invasão por parte do grupo, as pessoas que residiam na fazenda detinham a posse, mas foram privadas dela, em virtude de uma violência (uso da força);
Sendo assim, a ação viável para hipótese apresentada seria a de reintegração de posse a fim de que o invasor venha a ser desalojado do imóvel que anteriormente eles detinham a posse.
Ponto a ser observado quanto à ação de reintegração de posse é que há viabilidade da utilização do desforço imediato, consoante se observa do parágrafo §1º do art. 1.210
§ 1º O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse.
Depreende-se, portanto, da leitura deste parágrafo que se no exemplo citado acima as pessoas se utilizam de meios para o exercício da sua defesa estariam amparadas pela lei, desde que não houvesse excessos e que fosse de forma imediata, no momento ou logo após a prática do esbulho.
Dentre os requisitos para a propositura da ação de reintegração de posse vale destacar que o autor deverá comprovar que realmente possuía, antes do esbulho, a prática daquele imóvel;
Ademais, deverá demonstrar também que o réu praticou o esbulho por ele alegado, não podendo se olvidar de indicar a data em que a posse do imóvel foi retirada de si.
A ação reivindicatória, por sua vez, trata-se de ação que irá reaver a posse para a pessoa que tem em seu nome o registro daquela propriedade, mas não está efetivamente na posse do bem;
Para essa ação o importante aqui são os documentos comprobatórios que demonstram ser o imóvel, objeto da ação, propriedade do reivindicador, assim, havendo o registro em nome do autor da ação esse instrumento será viável.
O que se percebe, portanto, é que existem as ações possessórias, as quais podemos visualizar a ação de reintegração de posse, ação de manutenção de posse ou interdito proibitório;
E temos as ações petitórias, que a doutrina irá chamar de ações possessórias indiretas, e que neste caso dividir-se-ão em ação reivindicatória e ação de imissão na posse;
Ambas são ações com o propósito de proteger de algum modo a posse, mas os pedidos são diversos conforme visto acima; as petitórias sendo ações que vão se amparar no domínio/propriedade do bem e as possessórias possuindo um sustentáculo na posse, sem discutir domínio/propriedade;
Princípio da Fungibilidade (Ações possessórias x petitórias)
Vale salientar, ainda, que no caso das ações possessórias existe a viabilidade de aplicação do princípio da fungibilidade, ou seja, em uma hipótese que o instrumento legal cabível de maneira correta, por exemplo, seria a ação de reintegração de posse o autor entra com uma ação de manutenção de posse;
Assim, o juiz ao verificar o caso concreto poderá aplicar este princípio, desde que não haja erro grosseiro, é o que se observa do artigo 920 do Código de Processo Civil:
A propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela, cujos requisitos estejam provados.
Este princípio se mostra importante na medida que viabiliza o juiz realizar o julgamento de uma ação possessória pela outra sem ter que o autor emendar a inicial, conferindo celeridade e razoável duração ao processo.
Ademais, pode vir a ocorrer a hipótese de que no momento da propositura da ação havia uma determinada situação fática que não mais exista durante a distribuição do processo;
Assim, imagine um cenário que representaria hipótese de ameaça e por consequente haveria de ser proposta uma ação de interdito proibitório, mas que no momento de distribuir o processo já tenha ocorrido a invasão que representa o esbulho.
Desse modo, o juiz ele poderá utilizar-se da fungibilidade para tratar o caso em questão como esbulho e não como mera ameaça, visto que essa situação fática não mais existe.
Seguindo essa linha de raciocínio, ponto muito importante é que embora seja viável o princípio da fungibilidade entre ações possessórias como foi amplamente abordado acima, não há o que se falar desse instrumento jurídico entre possessórias e petitórias;
Isto por que, conforme foi visto, o pedido dessas espécies de ações são diversos e por conseguinte não viabilizam a propositura da fungibilidade visto que estão amparadas em fundamentos distintos uma da outra.
SÍNTESE:
Dentre os pontos que merecem destaque, tem-se os seguintes:
- Ação reivindicatória: trata-se de ação que tem por base o domínio/propriedade e que visa reaver a posse de um determinado bem;
- A propriedade é o elemento a ser levado em conta nas ações reivindicatórias e não a posse
- Esbulho – privação total da posse do bem (cabimento – ação de reintegração de posse)
- Ação reivindicatória é diferente de ação de reintegração de posse; esta última tem por base legal a posse (propriedade x posse)
- Princípio da fungibilidade não é aplicável entre ações possessórias e petitórias (reivindicatória x reintegração de posse); embora seja aplicável entre ações possessórias.
PALAVRAS CHAVES (KEYS CODES): REIVINDICATÓRIA; PETITÓRIAS; POSSESSÓRIAS; REINTEGRAÇÃO DE POSSE.
REFERÊNCIAS:
Flávio, T. Direito Civil – Direito das Coisas – Vol. 4. São Paulo: Grupo GEN, 2020. 9788530989361. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530989361/.
BENEVIDES MARCELLO. Marcelobenevides, 2019. Ação Reivindicatória: Como Funciona?. Disponível em: <https://marcellobenevides.com/acao-reivindicatoria/>
TEIXEIRA FLÁVIA. drflaviaortega.jusbrasil, 2015. Qual a diferença entre as ações de reintegração de posse e a reivindicatória?. Disponível em: <https://draflaviaortega.jusbrasil.com.br/noticias/311631400/qual-a-diferenca-entre-as-acoes-de-reintegracao-de-posse-e-a-reivindicatoria>
NÓBREGA SAULO. lfg.jusbrasil, 2011. Aplica-se a fungibilidade nas ações possessórias?. Disponível em: <https://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/2653738/aplica-se-a-fungibilidade-nas-acoes-possessorias-saulo-nobrega-dos-anjos>
PLANALTO. Planalto.gov, c2021. Código Civil. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm>