imagem de uma casa linda ilustrando ações possessórias
CategoriasDireito Imobiliário

A posse é um instituto jurídico que está previsto no Livro III (Direito das Coisas) – sobre ações possessórias – Título I do Código Civil, no entanto, existem diversas correntes doutrinárias dispondo sobre seu significado e suas aplicações no ordenamento pátrio;

Por essa razão, no artigo em questão simplificaremos as principais teorias que se ocupam da definição termo, quais sejam, a Teoria Subjetiva de Savigny, bem como a Teoria Objetiva de Ihering;

Ademais, dentre as diversas classificações que as ações possessórias recebem, iremos estabelecer a distinção entre posse direta e posse indireta e seus respectivos desdobramentos.

Por fim, outros pontos, à exemplo da detenção e função social, também merecem atenção a fim de formar toda a compreensão no que diz respeito o universo das ações possessórias.

Para um maior compreensão e aprofundamento do assunto, sugiro também a leitura do nosso texto “AÇÕES POSSESSÓRIAS – DISTINÇÃO ENTRE POSSE NOVA E POSSE VELHA NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (LEI. 13.105/2015)”.

O que é posse? (Conceito e teorias justificadoras – direito civil)

Ao se falar em posse é possível observar a existência de uma amplo debate doutrinário no que diz respeito a sua definição; tal circunstância acabou por dar ensejo à criação de diversas teorias acerca da temática.

No entanto, dois autores se destacam quando o assunto envolve a definição do termo posse, são eles: Friedrich Calr Von Savigny, com sua Teoria Subjetiva e Rudolf Von Ihering que criou a Teoria Subjetiva; tais teorias serão analisadas detalhadamente mais à frente.

Ademais, outra tarefa árdua que os estudiosos do tema encontram é definir se a posse é um Fato ou um Direito, e aqui temos novamente muito debate e divergência acerca do tema;

Isso porque, alguns autores, à exemplo de Maria Helena Diniz, se posicionam no sentido de que a posse é um direito real, no entanto vale salientar, que trata-se de categoria jurídica indicada em lei e o Código Civil não aponta a posse como um Direito real;

Seria a posse, portanto, dotada de natureza jurídica especial, sendo um conceito intermediário entre os direitos pessoais os direitos reais e essa conformação híbrida não seria suficiente para retirar o caráter de “direito” da posse;

Certo é que, embora não haja um entendimento pacífico acerca da temática, a doutrina majoritária se posiciona no sentido de que a posse é sim um direito; Mas não se olvide que é considerada também uma situação de fato, em que o possuidor age como se dono da coisa fosse.

A seguir analisaremos as teorias da posse e seus desdobramentos no âmbito jurídico.

Teoria subjetiva da posse (Friedrich Calr Von Savigny) – Em ações possessórias

Savigny entende que posse é, além do domínio físico sobre determinada coisa, a intenção de ter essa coisa para si, bem como defende-la de eventuais intervenções ou agressões de terceiros.

O autor diz que seriam necessários dois requisitos cumulativos para a caracterização da posse: O primeiro deles Savigny nomeou de “corpus”, é o elemento material/objetivo da posse em que a pessoa exerce o domínio sobre a coisa;

Ainda, o segundo elemento, de ordem subjetiva, foi nomeado de “animus” que representava a intenção, a vontade do possuidor de ter a coisa para si; cumprido tais requisitos estaria caracterizada a posse.

Dizia ainda Savigny que, na ausência do primeiro elemento a posse seria mera manifestação psíquica do agente, uma vez que ele não possui a coisa em seu domínio, mas tão somente a vontade, logo, insuficiente para a caracterização da posse.

De outro modo, se ausente o segundo elemento da Teoria Subjetiva de Savigny àquele que possuía o domínio físico sobre a coisa seria o mero detentor, não havendo o que se falar em juridicidade nesta hipótese.

Ponto importante a destacar é que essa teoria foi considerada de ordem subjetiva uma vez que leva em conta de forma substancial o estado psíquico do agente como elemento de formação da posse.

Ao que tange o ordenamento jurídico pátrio, esta teoria não prosperou, sendo adotada como parâmetro para as relações jurídicas a teoria objetiva de Rudolf Ihering que veremos a seguir.

Teoria objetiva da posse (Rudolf Von Ihering)

Lhering, diferentemente de Savigny, entende que não há necessidade da intenção de ser dono da coisa, ou seja, o elemento “animus domini” não é elemento formador da posse;

O autor irá dizer que a posse é formada por apenas um elemento, qual seja, o “corpus”, em que a pessoa pode dispor fisicamente da coisa ou simplesmente exercer este contato.

Nessa teoria, o ânimo do agente de ser o proprietário da coisa irá dar lugar a uma intenção de exploração econômica do bem e tal intenção estará implícita do elemento “corpus”.

Da leitura do artigo 1.196 do Código Civil é possível perceber que o ordenamento jurídico brasileiro optou pela Teoria Objetiva da Posse de Ihering ao dispor que “considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade”

Ações possessórias: Classificação da posse

A posse é uma temática jurídica que admite diversas classificações, podendo ser quanto à relação pessoa-coisa (desdobramento da posse); quanto à presença de vícios (posse justa, injusta, violenta, clandestina, precária); quanto à boa fé (de ordem objetiva ou subjetiva); quanto à presença de título (com ou sem); quanto ao tempo (posse nova x posse velha); quanto aos efeitos (interdicta ou usucapionem);

No artigo em questão trataremos da posse em relação à pessoa-coisa, também conhecido como desdobramento da posse e que pode ser classificada como posse direta (também conhecida como posse imediata) ou posse indireta (também denominada de posse mediata).

Posse direta

Em termos simples, a posse direta pode ser entendida como exercício do poder de uso de um determinado bem; aquele que efetivamente se utiliza do bem em sua posse é quem exerce a posse Direita;

Contextualizando, imagine a relação existente entre locador e locatário de um determinado imóvel, podemos dizer que o locatário é quem exerce a posse direta do bem, uma vez que é ele quem tem a coisa materialmente, havendo um poder físico imediato;

Ponto importante a ser destacado aqui é que o possuidor direto tem o direito de se utilizar das ações possessórias a fim de proteger a sua posse, seja contra terceiros, seja inclusive contra o proprietário da coisa.

Desse modo, se durante a vigência de um contrato de locação de um determinado imóvel o proprietário invade o imóvel, poderá o locatário fazer uso das proteções possessórias para reaver o imóvel para si.

No entanto, vale salientar que o usa das ações possessórias como forma de proteger seus interesses não é de uso exclusivo do possuidor direto, podendo também o possuidor indireto gozar desses artifícios, conforme veremos a seguir.

Posse indireta

A posse indireta se manifesta naquele indivíduo que embora não exerça o domínio imediato sobre a coisa, possui os direitos inerentes à ela, razão pela qual também é conhecida como posse mediata; trata-se do proprietário da coisa.

O exemplo clássico doutrinário é a relação existente entre locatário e locador, este último muito embora não exerça o domínio direto sobre bem imóvel, possui outros direitos inerentes à propriedade;

Consoante visto acima, o possuidor direto por expressa previsão legal do artigo 1.197 do Código Civil poderá se utilizar das ações possessórias para proteger a sua posse, no entanto, a recíproca é verdadeira no sentido que o possuidor indireto também tem o direito de defender a sua posse contra o indireto;

Este entendimento pode ser observado no Enunciado nº 76 do CJF/STJ, da I Jornada de Direito Civil e é conhecido como “desdobramento ou paralelismo da posse”, tendo em vista a via de mão dupla para proteção de interesses.

Outro ponto de destaque é a observância à técnica processual, uma vez que o ordenamento jurídico dispõe de diversos instrumentos para atender as demandas que eventualmente possa surgir;

Sendo assim, em uma situação que aparentemente possa parecer hipótese de ingresso de ação possessória, em verdade é cabível outro tipo de ação, como no caso dos acordo para desfazimento de locação em que o locatário não cumpre a demanda e que a ação cabível será a de “despejo” e não de “reintegração de posse”

Mera detenção

Da leitura do art. 1.198 do Código Civil é possível observar que considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas.

Embora o tema em questão possa causar certa confusão entre o conceito de posse e detenção, a distinção ela se mostra bem nítida e não há o porquê da confusão, senão vejamos;

A detenção aqui é hipótese de posse desqualificada, ou seja, a pessoa não irá exercer o poder sobre a coisa, por que a ela somente cabe seguir as ordens e instruções do real possuidor; será mero detentor

Um exemplo seria o caseiro de uma fazenda em que o seu papel se restringe à conservação da posse daquele bem em nome do seu patrão, seguindo as diretrizes por este estabelecida.

Outro ponto a destacar é que em virtude dessa classificação e do propósito de conservação o detentor não poderá fazer uso das ações possessórias, tendo em vista que esses interditos possessórios são prerrogativas inerentes à posse e não à detenção.

Função social da posse

Tema de atual discussão diz respeito à função social da posse no sentido que se existe uma função social da propriedade nada mais coerente e isonômico do que atribuir também uma função social da posse;

Assim, se ao proprietário é concedida tutela jurídica em virtude do exercício do domínio da propriedade, ao mesmo tempo em que se exige dele o cumprimento de uma série de deveres, haveria de se discutir também a concessão de tais tutelas ao possuidor, cumprindo assim o princípio da isonomia previsto no caput da constituição Federal.

Ainda na seara da adoção de uma função social é importante destacar que não se trata de um tema que se restringe ao imaginário daqueles que o defendem, mas que há verdadeira disposição para sua inserção no ordenamento jurídico brasileiro;

Nesse sentido, é possível observar o projeto 699/2011 que dá uma nova redação ao artigo 1.196 do Código Civil evidenciado o instituto da função social da posse; o dispositivo passaria a viger com a seguinte redação:

“Considera-se possuidor todo aquele que tem poder fático de ingerência socioeconômica, absoluto ou relativo, direto ou indireto, sobre determinado bem da vida, que se manifesta através do exercício ou possibilidade de exercício inerente á propriedade ou outro direito real suscetível de posse”

Síntese

Entendido o instituto da posse, sobretudo suas classificações e desdobramentos no âmbito jurídico, cumpre destacar alguns pontos mais relevantes, quais sejam:

  • Existência de duas teorias principais para definição da natureza jurídica da posse (Teoria Subjetiva de Savigny e Teoria Objetiva de Inhering)
  • Teoria Subjetiva da Posse: Posse = corpus” (domínio material sobre a coisa)+ “animus” (intenção de ter a coisa para si)
  • Teoria Objetiva da Posse: Posse = “corpus” (disposição física da coisa, sendo a intenção de exploração econômica do bem implícita e parte formadora do elemento material)
  • Ordenamento jurídico pátrio adotou a Teoria Objetiva de Ihering, com previsão no art. 1.196 do Código Civil
  • Posse Direta como sendo o exercício imediato sobre a coisa; poder de uso do bem; àquele que efetivamente se utiliza do bem é possuidor direto
  • Posse Indireta como sendo o exercício mediato da coisa; não há aqui o domínio imediato sobre a coisa; o possuidor indireto é o proprietário
  • Detenção como sendo a posse desqualificada; o detentor acha-se em relação de dependência com o possuidor, conservando a posse em nome deste.
  • A função social da posse como tema de discussão tendo em vista a existência da função social da propriedade (aplicação do princípio isonômica da Constituição Federal).

PALAVRAS CHAVES (KEY CODES) – POSSE; PROPRIEDADE; DIREITO CIVIL; DIREITO IMOBILIÁRIO; AÇÕES POSSESSÓRIAS; SAVIGNY; IHERING

REFERÊNCIAS:

JURISWAY. jurisway.org, 2020. O que é posse direta e posse indireta?. Disponível em:

<https://www.jurisway.org.br/v2/pergunta.asp?idmodelo=720>

ARAMAYO ADVOGADOS. aramayoadvogados, 2021. Posse Direta e Indireta x Posse Justa e Posse Injusta.

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CASTRO DIEGO. diegocastro.adv, 2020. Posse direta e indireta no código civil explicado. Disponível em: <Diogo Castro>

GURJÃO VICTOR. victorgurjao.jusbrasil, 2015. Posse: conceito, teorias fundamentais e classificação. Disponível em: <jusbrasil>

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Flávio, T. Direito Civil – Direito das Coisas – Vol. 4. [Digite o Local da Editora]: Grupo GEN, 2020. 9788530989361. Disponível em: Biblioteca integrada/.