INTRODUÇÃO
No artigo de hoje trataremos à respeito dos institutos da “posse nova” e “posse velha”, também conhecidos como ação de força nova e ação de força velha, no entanto, para uma maior compreensão da temática a ser abordada, antes é preciso entender alguns outros conceitos; vejamos.
O QUE SÃO AS AÇÕES POSSESSÓRIAS?
As ações possessórias (ou interditos possessórios) são ações que visam proteger a posse de bens móveis e imóveis e estão previstas no Novo Código de Processo Civil, mais especificamente em seus artigos 554 a 568.
Em algumas situações um indivíduo pode vir a sofrer lesão quanto ao seu direito de posse, seja pela ameaça da privação da posse, seja pela efetiva privação – que pode ser parcial ou total –; a estas formas de lesão foram atribuídos os nomes de ameaça, turbação e esbulho, as quais veremos mais à frente.
Sendo assim, foram criados mecanismos que assegurassem o direito do possuidor, de modo que tais lesões pudessem ser combatidas e a tutela jurídica efetivamente atendida. Dentre as ações possessórias podemos citar: ação de reintegração de posse, ação de manutenção de posse e o interdito proibitório.
Desse modo, atendido os requisitos previstos no art. 561 do NCPC (prova da posse; realização da turbação ou esbulho praticado pelo réu; a data das lesões e a continuação ou perda da posse p/ as ações de manutenção ou reintegração) terá o indivíduo condições de ingressar com as referidas ações.
Ponto a destacar e que guarda íntima relação com a temática central do artigo em questão é que a menção das datas é de extrema relevância, tendo em vista é que são elas que irão definir se é caso de posse nova ou velha.
Mas cuidado! A posse de modo algum pode vir a ser confundida com a propriedade, são conceitos distintos com características próprias e que atendem demandas diversas, inclusive com ações diferentes para cada uma delas. E é exatamente essa diferença que trataremos a seguir.
DIFERENÇA ENTRE POSSE E PROPRIEDADE; (POSSE X PROPRIEDADE)
Da leitura do artigo 1.196 do Código Civil é possível observar que o possuidor é todo aquele que tem de fato o exercício, pleno (ou não), de um dos poderes inerentes à propriedade, quais sejam o de usar, gozar, dispor e reaver o bem.
Por sua vez, ao analisar o artigo 1.228 do Código Civil veremos que o legislador se ocupou de definir o conceito de proprietário ao estabelecer que este tem a faculdade de usar, gozar, dispor da coisa, bem como revê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha;
Desse modo o que se percebe é que a propriedade é um direito real, em que o proprietário terá todos os poderes sobre aquele bem – até o limite estabelecido em lei – , inclusive com registro em cartório.
Por sua vez, a posse tem caráter híbrido, dotada de natureza jurídica especial (está entre os direitos reais e pessoais), mas é também uma situação de fato, na qual o possuidor age como se dono da coisa fosse, mas não é, e será dividida em espécies, à exemplo, da posse direta e indireta*, justa e injusta.
Vale destacar que os institutos da posse e da propriedade abre o debate para diversas discussões doutrinárias e que em alguns pontos há divergência em relação ao seu conceito.
O QUE É ESBULHO?
O esbulho ocorre naquelas situações em que a posse é retirada do seu detentor, ou seja, aquele que antes tinha posse sobre um determinado bem não mais terá, tendo em vista que alguém a retirou clandestinamente, por abuso da sua confiança ou de maneira violenta.
Fato curioso é que o esbulho pode vir a ser cometido inclusive pelo proprietário do bem; imagine uma situação em que duas pessoas firmam contrato de locação, no entanto, o locador ainda durante a vigência do contrato resolve por retirar à força o locatário;
Perceba, embora ele seja proprietário do imóvel, o contrato ainda estava vigente e portanto o direito de posse do locatário era legítimo e não pode ser ferido, logo, poderá o possuidor entrar com ação de reintegração de posse para preservar o seu direito ou até mesmo o exercício da autotutela da posse (desforço imediato).
Quanto ao desforço imediato, ou seja, o uso da força para retomada da posse, o código civil é claro no sentido de que este só poderá ser utilizado logo após a ocorrência do esbulho e que os atos de defesa deverão ser somente aqueles que se mostrem suficiente para recuperação da posse, sob pena de responsabilização por eventuais excessos.
O QUE É TURBAÇÃO?
A turbação é instituto muito parecido com o esbulho, porém, aqui o possuidor legítimo não irá perder integralmente a posse do bem; nessas situações, um terceiro irá interferir na manifestação livre e integral do direito de posse, mas não em sua totalidade.
A turbação, em uma análise semântica da palavra, remete a ideia de perturbação, incômodo, que é justamente o que ocorre no caso em questão; o possuidor sofrerá com algum fato ou ato impeditivo de terceiro que irá interferir no exercício da sua posse.
A fim de visualizar como ocorre este instituto imagine o seguinte exemplo: João e Marcos são vizinhos, este último está realizando uma obra em sua casa e percebe que a abertura de um caminho no terreno de João para a passagem de materiais de construção daria celeridade ao seu projeto;
Observe que em momento algum Marcos retirou a posse de João, no entanto, criou uma situação incômoda e que restringe o livre exercício do direito de posse por parte de João.
Sendo assim, ocorrendo a hipótese de turbação poderá aquele que tiver o seu direito de posse lesado ingressar com ação de manutenção de posse a fim de viabilizar que o possuidor permaneça na posse da coisa turbada.
O QUE É AMEAÇA DA POSSE?
A ameaça, por sua vez, como o próprio nome sugere, ocorre em situações em que se visualiza uma iminência de esbulho ou turbação, ou seja, a lesão à posse ainda não ocorreu efetivamente, no entanto, há forte e fundado receio de que venha a ocorrer.
Um exemplo em que se pode visualizar a ameaça são as ações de determinados movimentos sociais em regiões rurais que se organizam e cercam a propriedade de terceiro e que embora não tenha ocorrido efetiva invasão, há a presença de forte indícios de turbação ou esbulho.
A seguir, veremos cada uma das ações possessórias cabíveis para confrontar as hipóteses de esbulho, turbação e ameaça.
AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE (CABIMENTO)
Agora que você já conhece os institutos do esbulho e da turbação fica muito mais fácil entender o processo de reintegração de posse e enxergar como essa espécie de ação possessória é fundamental para tutela do direito do possuidor.
A ação de reintegração de posse é a ferramenta jurídica que viabiliza a recuperação do bem por parte do possuidor naquelas situações em que a posse foi retirada dele de forma clandestina, à força ou por abuso de confiança, ou seja, quando ocorrer o esbulho.
Quanto à previsão legal, o novo Código de Processo Civil (lei. 13.105/15) dispõe em seu artigo 560 que o possuidor tem o direito a ser reintegrado na posse em caso de esbulho, garantindo assim o amparo legal na recuperação do bem violado.
Vale ressaltar que para o exercício de tal direito é necessário o autor que ingressar com a ação comprovar que era de fato o possuidor do bem em questão, além de demonstrar a efetiva prática do esbulho por parte do réu;
Ainda, cabe ao autor, para fins de definição do rito processual a ser seguido, indicar a data de quando ocorreu o esbulho; cumprindo tais requisitos poderá e estando a petição inicial devidamente instruída expedir mandado de liminar para a reintegração.
AÇÃO DE MANUTENÇÃO DE POSSE (CABIMENTO)
Ao que tange à manutenção da posse, trata-se de ação que será utilizada nas situações em que ocorrer a turbação e que, assim como o esbulho, encontra previsão legal no artigo 560 do Novo Código de Processo Civil;
Dispõe o referido dispositivo legal que nas hipóteses de turbação o possuidor será mantido na posse, logo, o que se percebe é que é uma ação que tem por propósito a conservação do possuidor legítimo naquele bem móvel ou imóvel que está submetido à perturbação.
Vale salientar que em se tratando de turbação esta deve ser de cunho material, ou seja, deve existir de fato um comportamento por parte de terceiro que resulte no incômodo ou perturbação da posse;
Do contrário, não há o que se falar em ação de manutenção de posse, uma vez que ainda haja ameaça com a manifesta intenção de privação da posse, a ação de manutenção de posse não seria o instituto adequado à resolução do problema, mas o interdito proibitório que veremos adiante.
Quanto aos requisitos para que o possuidor possa ingressar com a ação de manutenção de posse, esses são bem similares ao do esbulho, quais sejam: comprovação da posse, a prática da turbação por parte do réu, além da prova de continuação na posse, embora turbada.
INTERDITO PROIBITÓRIO (CABIMENTO)
Dispõe o Novo Código de Processo Civil (lei. 13.105/15), em seu artigo 567, que o possuidor direto ou indireto que tiver justo receio de ser molestado na posse pode realizar um requerimento ao juiz a fim de que sejam tomadas as medidas necessárias para evitar o esbulho ou turbação iminente;
Para tanto, o juiz expedirá um mandado proibitório em que caso o iminente agressor venha a descumprir o preceito será aplicada determina pena pecuniária em face dele.
Portanto, o interdito proibitório é instrumento eficaz naquelas situações em que a privação da posse ainda não ocorrer, mas há fortes indícios de que possa vir a acontecer a qualquer momento, protegendo assim a posse.
AÇÃO DE FORÇA NOVA X AÇÃO DE FORÇA VELHA (POSSE NOVA X POSSE VELHA)
Entendido os conceitos de esbulho, turbação, ameaça e as respectivas ações que conferem proteção à posse, daremos início à análise das formas de reconhecimento das ações possessórias.
Nas ações de reintegração/manutenção de posse, a depender do tempo entre o esbulho/turbação e a efetiva propositura da ação, esta poderá ser de posse “nova” ou “velha”, também chamada de ação de força nova e ação de força velha.
A ação de força nova (posse nova) ocorre nas situações em que o lapso temporal entre o esbulho/turbação e a propositura da ação ocorre em menos de 1 (um) ano e 1 (um) dia. E no que isso influencia? Nesse caso, a ação seguira os procedimentos que estão previstos desde o artigo 560 até o 568 do Código de Processo Civil.
Por sua vez, a ação de força velha (posse velha) é visualizada nas hipóteses em que o tempo entre o esbulho/turbação e a efetiva propositura da ação se dá em prazo maior que 1 (um) ano e 1 (um) dia. Assim, a ação seguira o procedimento comum.
Mas atenção! Embora as ações possessórias com prazo superior a 1 (um ano) e 1 (um dia) sigam o procedimento comum, consoante o disposto no art. 568, isso não significa que ela perderão o caráter de ações possessórias, sendo este preservado.
SÍNTESE
Dentre os pontos de relevante do presente artigo, cabe destacar os seguintes:
- As ações possessórias enquanto instituto que visa a proteção da posse bens móveis ou imóveis (previsão legal – art. 554 a 568, CPC)
- Esbulho – privação total da posse do bem (cabimento – ação de reintegração de posse)
- Turbação – privação parcial da posse do bem; incômodo/perturbação (cabimento da ação de manutenção da posse)
- Ameaça – iminência de esbulho ou turbação (cabimento da ação de interdito proibitório)
- Posse nova x Posse velha: o lapso temporal entre a ocorrência do esbulho ou turbação e a efetiva propositura da ação para proteção da posse é que irá definir os procedimentos a serem seguidos no processo.
PALAVRAS CHAVES (KEY CODES): POSSE NOVA; POSSE VELHA; AÇÕES POSSESSÓRIAS; PROPRIEDADE; ESBULHO; TURBAÇÃO; AMEAÇA
* Para uma maior compreensão acerca dos institutos da posse direta e indireta sugiro ler nosso artigo “POSSE DIRETA X POSSE INDIRETA”
REFERÊNCIAS:
ALLEF ALESSANDRO. direito.net, 2015. A posse e as ações possessórias no CPC/2015. Disponível em: <Direito Net>
ARAMAYO ADVOGADOS. aramayoadvogados, 2021. Posse Nova e Posse Velha. Disponível em: <Aramayo>
BRLA ADVOGADOS. brla.jusbrasil, 2018. As ações possessórias e o novo código de processo civil. Disponível em: <JusBrasil>
EQUIPE SAJ ADV. blog.sajadv, 2018. Ações possessórias no novo CPC: aspectos gerais e mudanças.
Disponível em: <SajaDV>
FACHINI TIAGO. Projuris, c2021. Ações possessórias: O que é, tipos e como funciona.
Disponível em: <ProJuris>
COSTA MARIANA. aurum, 2021. Ações possessórias no novo CPC: aspectos gerais, tipos e requisitos.
Disponível em: <Aurum>
FREITAS DYEGO. Megajuridico, 2016. Posse ou Propriedade? Qual a diferença. Disponível em: MegaJuridico
PRADE ARANEGA. Advocaciaaranega, 2017. Esbulho, Turbação e ameaça. Disponível em: Aranega
PLANALTO. Planalto.gov, 2021. Código De Processo Civil. Disponível em:<Planalto>
Flávio, T. Direito Civil – Direito das Coisas – Vol. 4. São Paulo: Grupo GEN, 2020. 9788530989361. Disponível em: Biblioteca/.